O indiciamento precisa acabar

Um ato policial inútil, burocrático, usado como marketing midiático, podendo ser usado ainda como ferramenta para a corrupção, além de ser juridicamente irrelevante e nefasto.

O “indiciamento” nada mais é do que o registro, feito pela polícia, de um investigado que, na opinião do delegado responsável pelo inquérito, é o autor do fato apurado.

Não existe uma normatização que fundamente tal ato, tampouco razões e/ou consequências de tal ato.

Sendo assim, o ato de “indiciar” alguém é totalmente irrelevante, pois, em regra, não traz qualquer desdobramento do ponto de vista jurídico.

Quando ouvimos na imprensa que “Fulano de Tal” foi indiciado, tendemos a pensar que Fulano é o culpado e que ele se deu mal, foi pego e deverá ser preso. Quando na realidade, “Fulano de Tal” ser indiciado não tem influência nenhuma na decisão de denunciar ou não do Ministério Público, muito menos na decisão de condenar do Judiciário. Ou seja, o indiciamento por si só, não gera processo, nem condenação.

Caberá ao Ministério Público analisar os fatos narrados no inquérito policial e as evidências nele expostos parar decidir se caberá denúncia, para aí sim, haver um Processo Criminal contra “Fulano de Tal”. O ato do indiciamento ao final do inquérito é simplesmente irrelevante para a tomada de decisão do Promotor de Justiça ou mais a frente na sentença judicial.

Embora a Lei 12.830, de 20 de junho de 2013, tenha vindo para “dispor sobre a investigação criminal conduzida pelo delegado de polícia”, mencionando o indiciamento no artigo 2.º, parágrafo 6.º, não alterou em absolutamente nada a irrelevância processual do indiciamento. Até porque se tivesse interferido nos atos do Ministério Público e/ou do Poder Judiciário seria totalmente inconstitucional.

Na prática, o ato do “indiciamento” tem três efeitos nefastos:

O primeiro é a existência de mais uma burocracia no já burocrático inquérito policial, que faz os policiais perderem tempo, energia e recursos materiais para fazer algo inútil.

O segundo efeito é a possibilidade de tal “instrumento” ser usado como ferramenta para a corrupção ou para manchar reputações. Embora não tenha qualquer consequência jurídica para o indiciado, este fica com seus registros policiais marcados como “INDICIADO”, mesmo que ele não venha nem a ser denunciado pelo MP ou que ele venha a ser absolvido pelo juiz.

Com isso, cria-se uma indústria do indiciamento onde maus policiais ameaçam indiciar a pessoa, maculando seu nome, caso ela não pague propina por exemplo. É muito comum, dois casos idênticos terminar com o indiciamento em um e sem indiciamento no outro. Além disso pode haver a ameaça de INDICIAR para chantagens políticas, já que obviamente ninguém quer ter seu nome estampado no jornal escrito INDICIADO PELA POLÍCIA!

O terceiro efeito nefasto é a judicialização desnecessária ocasionada pelo indiciamento já que muitas vezes a defesa do investigado ingressa na justiça com habeas corpus para que seu cliente não seja indiciado ou para desfazer o indiciamento já feito, ou seja, tal ato, além de inútil, ainda acarreta a oneração da justiça, gerando gastos e movimentando desnecessariamente o aparato estatal.

CONCLUSÃO
A atividade investigativa policial é demasiadamente importante e deve ser valorizada com a promoção da celeridade, economicidade, eficiência, dinamismo e cientificidade e não deve ser contaminada por atos desnecessários que promovem a burocracia, a alocação desnecessária de agentes públicos e atos que servem de instrumento para maus policiais visando vantagem econômica, perseguição, chantagens políticas ou destruição de reputação.

A relevância da polícia investigativa está na capacidade de elucidar crimes e levar os criminosos ao banco dos réus para serem condenados e não em atos pomposos, pseudo jurídico e inúteis que induzem a população a ideias pré-concebidas, errôneas e à condenação de pessoas pela opinião pública, muito antes delas serem realmente condenadas.

Essa é uma das reformas que o Brasil precisa enfrentar no sistema de persecução penal, se quisermos ser levados a sério.

Imagem ilustra o colunista.

Lucho Andreotti

“Lucho” Andreotti é bacharel em Jornalismo e Direito, Pós Graduado em Segurança Pública, Policial Civil, Coordenador Nacional do Movimento Policiais Livres, Presidente do Instituto NISP (Novas Ideias em Segurança Pública), Assessor Parlamentar, Colunista do Boletim da Liberdade e Autor de dois livros.

 
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